O CRISTÃO E A CONSCIÊNCIA NEGRA

20 de novembro - o Dia da Consciência Negra - consta como feriado no Calendário do nosso país.
A data homenageia Zumbi, um escravo que foi líder do Quilombo dos Palmares. Zumbi morreu em 20 de novembro de 1695. A data foi criada com o objetivo de fazer uma reflexão sobre a importância do povo e da cultura africana, assim como, o impacto que tiveram no desenvolvimento da identidade da Cultura Brasileira. A Sociologia, a Política, a Religião e a Gastronomia, entre várias outras áreas, foram profundamente influenciadas pela Cultura Negra. Este é um dia de comemorar e mostrar profundo apreço pela Cultura Afro-brasileira, mas não é algo celebrado por todos!
Como cristã e negra penso que podemos sim celebrar, mas não adianta fechar os olhos quanto a uma questão muitíssimo séria - O racismo existe e está presente em toda a sociedade, inclusive no meio cristão. Como a Igreja Cristã de hoje pode abordar e combater tamanho mal? Confundidos com ladrões, comparados a macacos, insultados simplesmente pela cor da pele. Mesmo em pleno século XXI, não são raros os casos de racismo no mundo, que vão desde uma piada contada numa roda de amigos até registros de injustiças, crimes e mortes. Há algum tempo atrás, os campos de futebol viraram cenários de lamentáveis manifestações desse tipo. Quem não se lembra da triste cena de um torcedor espanhol jogando uma banana em direção ao jogador brasileiro Daniel Alves durante uma partida? E de toda uma torcida no Peru imitando o som de macaco nas vezes em que, o também brasileiro, Tinga pegava na bola? Fora do esporte, as cenas de preconceito são ainda mais frequentes, e dentro da própria Igreja, não escapamos disso... São inúmeras as ocorrências de discriminação e constrangimento no dia a dia, que normalmente acontecem em lojas, restaurantes, empresas e agências de seleção de pessoal. E muitas vezes, a agressão não é só verbal ou psicológica, é física também, e pode acabar em morte.
No Brasil, a possibilidade de um adolescente negro ser vítima de homicídio é 3,7 vezes maior do que a de um branco, segundo um levantamento divulgado em 2013 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). No estudo, o Espírito Santo aparece como o segundo estado, numa lista de 10, que oferece mais perigo para o jovem negro, perdendo só para Alagoas.
Combatido na Bíblia
A Bíblia é clara no combate à discriminação de qualquer espécie. Em Tiago 2.1, há o alerta: “Meus irmãos, como crentes em nosso glorioso Senhor Jesus Cristo, não façam diferença entre as pessoas, tratando-as com parcialidade”. No texto de Atos dos Apóstolos, a Igreja de Antioquia – uma Comunidade de fé majoritariamente helenista –, nos dá uma bela lição sobre a igualdade racial e o empoderamento das etnias na comunidade nascente (At 13).
O Pentecostes posto em prática, diferentemente da Igreja de Jerusalém, liderada por hebreus (At 15). Podemos destacar dois escritos de Paulo, o Apóstolo das etnias. Ele escreveu uma linda Carta a Filemon, Áfia e Arquipo onde propõe a superação da lógica escravista. Ainda, na Carta aos Gálatas (Gl 3.24-29), Paulo chega a ir mais adiante ao romper com a estrutura hierárquica greco-romana, e de qualquer outra sociedade, que fundamenta o seu descaso pelo outro por motivações raciais (judeu ou grego), social (escravo ou livre) e de sexo (homem ou mulher) ...
Chamados para lutar
Apesar dos diversos casos envolvendo racismo nas igrejas, muitos líderes cristãos se envolveram nessa causa. O inglês Willian Wilberforce, no século XIX, dedicou sua vida na luta abolicionista na Inglaterra. Foram 40 anos até que uma lei pondo fim ao tráfico de escravos fosse aprovada. Com sua experiência política e sua fé firme no Senhor, ele pôde ver seu país extinguir o comércio de escravos e influenciar todas as outras nações que ainda se beneficiavam desse mal. O batista Martin Luther King também. Combateu a segregação racial nos Estados Unidos e batalhou pelos direitos civis dos negros. Mesmo enfrentando ameaças, agressões, prisões, maus-tratos à sua família, ele não desistiu. Um atentado tirou a vida do pastor negro norte-americano, mas sua luta não foi em vão.
O líder sul-africano Nelson Mandela, que era metodista, levantou-se contra o sistema de segregação social. Ele passou 27 anos preso por resistir ao regime, mas sua luta resultou no fim do Apartheid, tornando-se o primeiro negro presidente da África do Sul (1994-1999).
Existem materiais em nossa Igreja disponibilizados pela Área Geral, como a Carta Pastoral de Combate ao Racismo, a Campanha de Combate ao Racismo (nas Redes Sociais) e material para Escola Dominical que abordam esse assunto auxiliando na formação dos cristãos. A partir daí precisamos levantar a discussão, estimular e contribuir para a reflexão e também promover ações proativas para a superação do preconceito.
Nesse tempo de 500 Anos da Reforma Protestante e 150 Anos do Metodismo no Brasil, pesquisei e conclui que está no DNA dos Metodistas o combate ao racismo e às desigualdades. John Wesley pregava nas praças, e muitos que eram tidos como excluídos da sociedade abraçaram o Evangelho. Os Metodistas nasceram, então, com o cunho social muito elevado – precisamos dar continuidade à missão.
Longe de ser uma questão resolvida ou enterrada no passado, o racismo ainda está presente na sociedade. E a Igreja tem um papel fundamental nesta questão: ela precisa se levantar como Atalaia da Verdade e ser Sal e Luz, ensinando que o homem foi criado a imagem e semelhança de Deus, nesse grande Campo Missionário.
"Gente incômoda"
O título acima foi dado por Jr. Guzzo, da Revista Veja numa edição da primeira semana do mês de outubro. Jr. Guzzo faz duras críticas contra os evangélicos de forma generalizada e expõe todo seu desprezo com a liberdade religiosa, claramente apoiando o fim desse direito. Em seu artigo, suas palavras tomam uma conotação ainda mais preconceituosa:
“Esse povo, em grande parte do ‘tipo moreno’, ou ‘brasileiro’, vem sendo visto com horror crescente pela gente de bem do Brasil”.
Como evangélica e jornalista, quero dizer que o artigo é mal escrito, confuso em sua abordagem e, comete erros básicos, como referir-se ao público em questão com termos discriminatórios de raça e cor e ainda com uma conotação pejorativa. Esse articulista não deixa claro quais são as pessoas de bem a quem os evangélicos perturbam...
Na contramão disso - Incomoda mesmo
Contudo, não os achando, arrastaram Jasão e alguns outros irmãos para diante dos oficiais da cidade, gritando: "Esses homens que têm causado ALVOROÇO por todo o mundo, agora chegaram aqui, e Jasão os recebeu em sua casa. Todos eles estão agindo contra os decretos de César, dizendo que existe um outro rei, chamado Jesus". (Atos 17.6-7).
Tal incômodo poderia ser gerado pelos evangélicos justamente pelo fato do Cristianismo representar ideais que vão na contramão de muitas ideologias da sociedade Pós-Moderna.
Numa democracia toda são livres para expressar e defender suas ideias e ninguém é obrigado a concordar com elas. Estamos incomodando? E aí vale usar termos preconceituosos na tentativa de desqualificar os cristãos diante do restante da sociedade? Como se não houvesse contribuição nenhuma dessa parcela da população na construção e evolução da Nação? Aqui estão alguns morenos, dessa ‘incômoda religião’, que segundo a matéria, se tornou um “problema sem solução”.
Proposta Litúrgica alusiva ao Dia da Consciência Negra
Camila de Abreu Jornalista Regional