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UM CULTO VIVO, A VIDA COMO UM CULTO!


Quando falamos em Música e Arte, falamos de algo muito delicado, pois envolve sensibilidades, subjetividades, exposição de ideias e vaidade. Envolve também a percepção sobre si mesmo, tanto de quem cria quanto de quem aprecia, usufrui (que é uma outra forma de criar).


No artista há sempre, de certa forma, uma busca por aprovação e aceitação. Admitindo ou não, aceitando ou não, usando o nome que for (servo/a, levita, irmão/ã) gostamos de aparecer, ou pelo menos que nosso trabalho apareça. E isso deve ser encarado com tranquilidade, porque faz parte da natureza humana, faz parte dos atributos dos dons artísticos, faz parte da gente. FAZ PARTE! Quem faz uma obra artística deseja que esta obra seja vista, apreciada, ouvida, quer um público. A arte é uma poderosa forma de expressão e de comunicação e requer, sim, uma audiência.


Um livro, um poema, desejam um leitor. Uma música, uma declamação, anseiam por ouvidos atentos. Uma escultura, uma pintura querer ser vistos.


Ser artista é dom de Deus, e como tudo que Ele criou, é muito bom. Mas a humanidade decaiu, e afetou todas as áreas da vida, incluindo as expressões artísticas.


Historicamente a igreja protestante brasileira se afastou da maioria das artes, exceto a música, e mesmo assim aceita apenas algumas formas musicais. Mesmo com a redescoberta de outras expressões (dança, teatro, pintura) a música ainda é a mais forte e poderosa forma artística no meio cristão, e essa música é, em sua maior parte, expressa (e talvez somente aceita) na forma de louvor e a adoração, nunca como recreação, romance, protesto/reflexão.


O louvor e a adoração são vontade de Deus, Ele nos criou para o louvor da sua glória (Efésios 1.6). A expressão de adoração e louvor estão corretas, mas em meio a tudo isso está a natureza decaída do ser humano, o que torna essa área em um campo minado. Não por causa de Deus, mas por nossa causa.


Estamos diante de conflitos. Conflitos internos e individuais; conflitos externos e coletivos. Não há como sair ileso.


Os ministérios de música, ou de louvor, ou de adoração e outros nomes que as igrejas usam estão envolvidos nesse conflito, que tem um palco privilegiado e específico: o momento do culto.


Por isso é importante falarmos do culto, muitas vezes banalizado, tornado ordinário, sendo suprimido em alguns modelos de igreja em células ou usado como forma de manipulação das pessoas.


Células, discipulados, Escola Dominical são métodos importantes e necessários, mas não substituem o Culto, a reunião do povo de Deus com o propósito de louvar, adorar, confessar e ser desafiado e abençoado como corpo, como povo.


Dimensões do Culto


O culto como Mistério – O bispo Adolfo Evaristo de Souza afirmava que o Culto era mistério. Podemos planejar os cânticos, elaborar a liturgia, separar textos bíblicos, mas não podemos controlar como Deus vai agir e nem como as pessoas serão tocadas por Ele.

Precisamos lembrar que o dono do culto é Deus e que o Espírito Santo pode atuar livremente, desde um vento suave até como um estrondoso terremoto, e que a mesma palavra pregada por um será recebida por muitos de maneiras diversas, com diferentes aplicações pessoais, pois Deus fala a todos, fala ao povo, mas também fala individualmente. O mesmo vale para as ministrações nos momentos de cânticos. O culto é mistério, pois devemos sair com algo diferente, mas para isso devemos entrar com a mente, a alma e o coração abertos, desejando algo a mais, e não apenas fazendo mecanicamente “a nossa parte”. Isso é banalizar o culto. Precisamos entender que ali é lugar privilegiado da manifestação de Deus. É o momento escolhido pelo Pai para instruir seu povo e para receber o incenso suave do louvor e oração das vidas que formam o corpo de Cristo, que deve se preparar durante a semana para esse encontro especial! Por isso é HONRA ministrar (servir) nesse momento único. O culto é Sinal – O ajuntamento de pessoas deve sinalizar que há algo diferente e importante acontecendo. Quando na rua as pessoas veem um grupo olhando para o mesmo lugar, acabam parando para prestar atenção, para ver o que está acontecendo. Onde há um grupo de pessoas com o mesmo foco de atenção, há a curiosidade dos outros que estão de fora. Assim deve ser o culto e seus participantes. A nossa atenção e entrega àquele momento deve despertar o desejo de participação dos que estão fora. “Alegrei-me quando me disseram: vamos à casa do Senhor” (Salmo 122.1).


Por isso o culto deve ser vivo, animado - “repleto de alma” – com emoção e entendimento, com sentimento e sentido, não algo aleatório, solto e improvisado, que não quer dizer que deva ser rígido e engessado.


O culto deve sinalizar vida, esperança, desafio, missão e bênção O Culto é oferta – ofertar não somente financeiramente. Oferta é muito mais que dar dinheiro, pois o que deve ser ofertado é a vida! Esse é o nosso sacrifício de louvor: “Portanto, ofereçamos sempre por ele a Deus sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o seu nome” (Hebreus 13.15). Não são trazidos mais sacrifícios de animais, como no Antigo Testamento, pois Jesus foi o sacrifício único e perfeito por toda a humanidade, por isso, em uma troca injusta, oferecemos simbolicamente nossa vida total no altar, por meio de nossas orações, cânticos, expressões de adoração e gratidão, com nossos bens, serviços e intenções. O culto, assim como a Escola Dominical e outras reuniões da igreja, é local de aprendizagem, de doutrinamento e partilha de valores comuns e importantes à vida e à identidade da comunidade cristã, especificamente da nossa identidade metodista, e por tratar de valores pessoais e coletivos, chegamos a outra dimensão do culto. O Culto é confronto – um momento especial, diferente do dia a dia, mas que deve influenciá-lo. No culto, na tradição litúrgica protestante, iniciamos invocando a Santidade do Senhor por meio da Adoração e das invocação.


Quando adoramos, refletimos sobre a santidade de Deus e, como uma folha branca colocada sobre uma luz forte, vemos toda a nossa imperfeição. Durante o culto a SANTIDADE de Deus confronta e revela a nossa PECAMINOSIDADE.

Durante o culto é pregada e revelada a Palavra de Deus, CONCEITOS DIVINOS confrontam nossos CONCEITOS HUMANOS.

Pela Palavra nos é revelada a VONTADE DE DEUS, que se confronta com a NOSSA VONTADE. Esta dever ser submetida à primeira: “seja feita A TUA vontade”, assim oramos (Mateus 6.10).

Enfim, Deus revela sua própria glória, que ofusca toda a nossa tentativa de aparecer, nossos talentos, dons e orgulho: “Porque dele e por ele, e para ele, são todas as coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém” (Romanos 11.36). Todas essas dimensões do culto mexem com nossa sensibilidade, sobretudo a última. Muitas vezes chegamos a acreditar que somos nós os responsáveis pelo mover de Deus no culto. É como a história contada por Rubem Alves[1], de um galo que cantava todas as manhãs antes do sol nascer. Durante o dia ele falava a todos os outros animais que o sol nascia devido ao seu canto. Ele realmente acreditava que fazia o sol nascer com seu canto “ungido”. Até que um dia ele perdeu a hora de cantar e.… o sol nasceu sem seu canto! Não podemos ter essa síndrome de galo. Não fazemos o sol nascer, mas podemos, pelo menos, acordar os outros para ver o sol nascer e para viver mais um belo dia. Temos que ter consciência que estamos aqui para servir! Temos dons, talentos, devemos mostrar esses dons e talentos para os outros, mas que eles sirvam para que todos vejam que o sol nasceu, ou seja, que através das músicas, vozes e instrumentos, levemos as pessoas a olharem para Deus. Por isso o culto é lugar de conflito, mesmo de batalha! E a batalha não começa exatamente com um inimigo externo, começa dentro de nós, contra a nossa própria carnalidade, nossas próprias fraquezas, nosso próprio caráter. Somos artistas, músicos, cantores. Gostamos quando alguém elogia nossa performance e isso é bom. Nos sentimos bem em realizar boas obras. Queremos e devemos fazer com competência e excelência a nossa tarefa – “Cantai-lhe um cântico novo; tocai bem e com júbilo” (Salmo 33.3).


Não precisamos nos revestir de falsa modéstia ou sentir culpa ao receber um elogio. Isso faz bem para a alma. Mesmo fora do âmbito da igreja nos sentimos bem com uma música bem tocada e bem cantada. Há verdadeira emoção, e isso é lindo, mas devemos ir além. Para isso, mais do que ser um bom músico, mais do que ter um caráter de músico (ou cantor, ou artista), temos que buscar, nos ministérios que envolvem a arte e na vida cristã em geral, desenvolver em nós mesmo o caráter de Cristo Jesus.


Ele deve ser o centro, a motivação principal. Este é o foco que devemos buscar individualmente e em grupo, como ministério, parte do corpo: apontar para Jesus, exaltar o nome de Jesus Cristo. Que possamos crescer assim, desenvolver nossas sensibilidades com amor e respeito, não sendo sensíveis somente às nossas questões (sensibilidade egoísta), mas sensíveis a ponto de sentir a dor do outro, sentir os ventos e sinais do Espírito, sensíveis à presença de Deus. Que possamos crescer, tanto artisticamente (fazendo bem feito e cada vez melhor), com dedicação, tempo de estudo, de ensaio, como em comunhão uns com os outros e com Deus, orando juntos, convivendo mais, gastando tempo com as pessoas e os assuntos do ministério. E claro, nos fortalecendo espiritualmente. Lembremos de Efésios 6.12: “Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais”. Diante disso, que procuremos todo dia um renovar da mente, uma consagração diária desserviço em amor, comunhão e oração, para, no momento do culto, estarmos envolvidos de todo o coração, fazendo nossa parte com tamanha excelência, com tanta arte, a ponto de ninguém ver o artista que somos ou exaltar nossa performance, mas que com nossa arte consigamos que cada pessoa presente no templo tenha um vislumbre da glória de Deus e saia renovado, restaurado e rendido aos pés do Deus trino.


Que nossa vida seja um culto a Deus, e que nosso culto seja cheio de vida!

 

[1] ALVES, Rubem. Estórias de bichos. 2. ed. São Paulo: Loyola, 1990. p. 22-5

Rogério Silva Integrante do Departamento Regional de Música e Arte

#música #arte

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